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Denis Donaire

A origem de seu sobrenome é francesa, no entanto seus avós vieram da Espanha para o Brasil. Aos quatro anos de idade, começou a frequentar a Escola Técnica Rui Barbosa. Para ajudar a família, ainda jovem começou a trabalhar, e após um concurso, entrou no Banco do Brasil. Graduou-se em 1967 na Faculdade Municipal de Ciências Econômicas e Administrativas de Santo André, e no ano seguinte devido ao seu excelente desempenho, foi convidado a trabalhar como professor assistente na Fundação Santo André, onde também foi professor, diretor e criou o curso de Administração. Denis participou de todas as mudanças da USCS e inclusive foi pró-reitor do EAD e por cinco vezes o presidente da Associação dos Professores (APROXIMES).


Imagem do Depoente
Nome:Denis Donaire
Nascimento:11/08/1945
Gênero:Masculino
Profissão:Professor
Nacionalidade:Brasil
Naturalidade:São Paulo (SP)

TRANSCRIÇÃO DO DEPOIMENTO DE DENIS DONAIRE EM 21/09/2013

Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS)
Núcleo de Pesquisas Memórias do ABC e Laboratório Hipermídias
Depoimento de Denis Donaire, 67 anos.
São Caetano do Sul, 21 de junho de 2013.
Entrevistadora: não identificado
Equipe Técnica: Indefinida.
Transcritor: Bruna Moura e Luis Carlos dos Santos Filho.

 

Pergunta:
Para começar, quero pedir a gentileza de o senhor falar seu nome completo. Seu local de nascimento e a data: dia, mês e ano.

 

Resposta:
Bom. Meu nome é Denis Donaire, eu nasci no dia onze do oito de quarenta e cinco. Nasci em São Paulo, certo... no Brás, na rua hipódromo, trezentos e quarenta e seis.

 

Pergunta:
Qual a origem da família do senhor?

 

Resposta:
Olha a origem da minha família... meu sobrenome é francês, Donaire... Voltaire é francês, mas ela passa para o espanhol, naquelas pesquisas genealógicas que existem. Inclusive coincidem com isso, que inicialmente era da França, depois houve uma passagem pela Espanha, e meus avós espanhóis é que vieram para o Brasil. Na época das grandes movimentações de população da Europa para a América do Sul né.


Pergunta:

Os seus pais trabalhavam com o quê?

 

Resposta:
O meu pai era... trabalhava numa fábrica de calçados, ele era planchador. É uma atividade que faz o acabamento final no sapato, depois que o sapato está pronto. Então a um acabamento final que é feito. Meu pai trabalhava lá, certo. Trabalhou uma única firma durante quarenta anos.

 

Pergunta:
E a mãe do senhor?

 

Resposta:
A minha mãe era uma pessoa do lar, certo. E nós fomos dois filhos, aliás, eu sou gêmeo, mas naquela época a parteira demorou para atender a minha mãe, e meu irmão morreu enforcado no colo da umbilical, certo. E eu nasci... depois de 5 minutos.

 

Pergunta:
E como foi a infância do senhor? Como era sua casa... seu bairro...

 

Resposta:
Ah, era difícil. A infância foi muito difícil. Para você ter uma ideia, eu nasci nessa rua do hipódromo trezentos e quarenta e seis, era uma vila de casas, certo... com oito famílias morando, certo... e dois banheiros só, certo. Era difícil, nós vivíamos com dificuldades, meu pai era uma pessoa trabalhadora, mas não tinha um salário muito bom. E graças a deus eu tive sorte de ter facilidade com os estudos, então eu pude dar uma vida melhor para os meus filhos. Então realmente a educação me fez acender na classe social, certo. Porque era muito comum naquela época a existência de cortiços em São Paulo, estamos falando de 1945, certo. Então realmente a vida era muito diferente do que é hoje, não da nem para comparar. Praticamente eu vi nascer todas essas coisas: rádio, TV, às mídias eletrônicas, enfim... é engraçado que a gente não dá valor nessas coisas, mas antigamente as pessoas não tinham essas coisas, então era muito comum as pessoas colocarem a cadeira na calçada para ficar batendo papo, porque não havia outra forma de... as crianças brincavam na rua. As ruas eram realmente muito seguras né, você podia andar... mesmo quando jovem, eu vim às vezes de baile. Eu adorava baile, dançar... então eu vinha de madrugada e não tinha problema nenhum, certo. Hoje, sei lá... eu acho que as drogas que se popularizaram é que tem feito um mal muito grande para as famílias, para as gerações mais novas... e ainda a sociedade não conseguiu coibir isso daí.

 

Pergunta:
Na infância do senhor... você brincava, costumava brincar do quê?

 

Resposta:
[Risos]. Eu gostava muito de jogar futebol de botão, certo. Na minha... porque nossa casa era um cômodo e cozinha, e tinha um linóleo ali, assim... [entrevistado imitando um linóleo] então ali era o meu campo de futebol. Então eu usava tampinha de relógio [5'], punha a fotografia de jogador em baixo, o nome... tinha pelo menos uns dez, vinte times. Fazia campeonato comigo mesmo, para que eu não exercesse influência, porque evidentemente eu sou corintiano, e o Corinthians não ganhasse sempre, então eu marcava no tempo. Então: ‘Ó, tem cinco minutos, então...' Para tentar ser pelo menos um pouco isento [risos] em relação a isso, entende. Então, mas era... gostava muito de jogar futebol. No Brás tem uma... tem um presídio, o presídio do hipódromo. E do lado tinha uma chácara, que inclusive vendia goiaba, tudo. E depois ela foi desativada, talvez em função até do presídio e tal. Então ali, nós fizemos um campinho de futebol. Então ali era praticamente todo dia que a gente ia jogar futebol. Eu sou realmente muito aficionado de futebol, certo. Então era assim que eu tentava levar às aventuras da minha infância.

 

Pergunta:
E aí o senhor começou a ir para a escola com que idade?

 

Resposta:
Eu fui relativamente cedo. Naquela época eu já fui para uma pré-escola, porque em frente desse cortiço onde eu morava, tinha uma escola que chamava: ‘Escola Técnica Rui Barbosa'. Como era quase em frente de casa, meu pai resolveu me colocar lá, quando eu tinha uns quatro anos de idade. Então isso realmente, eu acho que ajudou na minha formação, embora como eu falei, eu tenho uma memória muito boa. Eu tenho uma memória assim... geográfica, entende. Eu consigo lembrar das coisas, inclusive em que local elas estão situadas, se eu estudar alguma coisa, eu sei se está em cima, em baixo, do lado... então isso me ajudou bastante...

 

Pergunta:
Como era essa escola? O senhor lembra?

 

Resposta:
Ah, era uma escola normal. Eu lembro que no intervalo vendia cocada, tinha uma mulher que fazia aquelas cocadas maravilhosa, então... poxa vida... [entrevistado se emociona e chora] (...) Desculpe... desculpe, mas a emoção... (...) são coisas muito boas... porque realmente... eu sou uma pessoa engraçada... eu choro nas coisas boas... eu me emociono... desculpa filha... (...) depois vocês cortam isso... [entrevistado chora novamente] ok, voltei... desculpa... (...) vamos continuar. Então era muito gostoso, era em frente de casa, depois... dali... acabei fazendo o primário lá... acabei fazendo o primário lá. E aí depois, o primário... eu tinha... como eu nasci no dia 11 de agosto, antigamente tinha o seguinte: você só podia fazer o quinto ano, se você tivesse completado onze anos até dia 30 de junho. Então por onze dias eu perdi, eu tive que fazer um ano de admissão. E aí eu prestei concurso... não é vestibular, mas era... para entrar no colégio do estado, que é o Domingos Faustino Sarmiento, que existe lá no bairro do Belém. Eu fiquei entre o Belém e o Brás, ficava umas... umas cinco, seis travessas de casa, certo. E aí eu lembro, entrei lá em nono lugar e tal. E ali eu fiz o ginásio científico. Ganhei várias medalhas do governo, porque eu era o primeiro da sala e tudo, então... eu tive sempre facilidade com essas coisas de estudar, tinha uma boa memória. Eu gostava de estudar, entendeu. Houve uma reviravolta grande [10'] quando... eu... (...) saí do, do... [entrevistado pensando] científico né. Antigamente tinha o científico, clássico. E fui trabalhar e passei à noite né, e fui estudar à noite. Bom, quando eu cheguei a estudar à noite e via as pessoas de gravata, de coisa, e isso trouxe... pô, aqui não da mais para ficar com aquelas brincadeiras que eu tinha, porque eu era muito gozador, muito brincalhão, certo. Gostava sempre de fazer _______ com as coisas. Então eu falei: ‘Pô, aqui agora...' Isso mudou a minha maneira de ver o mundo e tal. Se vê, o pessoal hoje quer se aposentar com trinta e cinco anos, eu já trabalho há cinquenta e quatro, há cinquenta... [entrevistado se corrige] cinquenta e quatro anos... eu já trabalho [risos]. E acho que é maravilhoso a gente poder trabalhar e ser útil. Eu adoro ser professor, mas vamos continuar se quer que eu conte a história da minha vida, então. Aí depois, terminado o colegial, vamos para a faculdade. Eu realmente não sabia o que eu ia fazer, certo. Porque as boas escolas... eu era muito bom aluno em química, eu pensei em fazer engenharia química, mas era só na USP, eu morava no Brás! Só tinha um ônibus que ia, era o Rebouças/Belém, que parava lá perto da Rebouças e ainda tinha que ir um trechão a pé. E eu precisava trabalhar, porque minha família tinha dificuldades né, eu tinha que ajudar em casa, tudo. Então eu peguei e fiquei sabendo que tinha uma faculdade aqui em Santo André, ‘Faculdade Municipal de Ciências Econômicas e Administrativas de Santo André', que era uma faculdadezinha pequenina, mas tinha um detalhe importante para alguém como eu, era de ‘graça'. Então eu peguei o trem lá na... eu até me matriculei... me candidatei na PUC. E peguei o trem, vim aqui em Santo André, fui lá conhecer a escola. A escola tinha uma classe para cada ano, primeiro ano, segundo ano, lá na avenida Portugal. Simpática, pequenina... eu falei, bom... é de graça né, vou fazer o quê... só que o exame dessa escola, foi antes da PUC, e aí eu fui aprovado, como eu fui aprovado, eu falei: ‘Ah, vou ficar por aqui mesmo, porque é de graça'. Então eu pegava o trem e vinha do Brás, eu morava a cinco, seis, travessas da estação do Brás. Foi ali que me formei. Me formei em 1967. No ano seguinte, devido ao meu desempenho, fui convidado a ser assistente de um professor, professor de estatística _________________. Esse professor foi quem me ensinou à estatística e eu passei a dar aula de estatística. Hoje eu tenho até dois livros escritos na área, e foi por aí que eu comecei e depois...

 

Pergunta:
Durante a faculdade o senhor trabalhava?

 

Resposta:
Trabalhava, trabalhava no Banco do Brasil. Eu... nesse ínterim quando eu comecei a trabalhar, oficialmente como office boy na General Eletric, que tinha uma fábrica na rua do hipódromo mesmo. Trabalhei na área de engenharia, tirava cópia, essas coisas. Depois de alguns meses, eu arrumei um emprego na companhia interestadual de seguros que ficava na rua do tesouro, 47. Fiquei um tempo lá, parece que um ano e tal. Depois acabei prestando um concurso para entrar no Banco da Lavoura de Minas Gerais. No Banco da Lavoura de Minas Gerais, eu trabalhei na rua Boa Vista que era lá a sede principal. Depois eles montaram uma agência aqui no Brás, na Rangel Pestana, quase esquina da rua Piratininga [15']. Aí eu vim trabalhar aí. Aí eu fiquei um tempo. E aí prestei concurso para o Banco do Brasil e entrei no Banco do Brasil. E devido a minha colocação, eu pude escolher inclusive onde eu ia ficar. Então eu fiquei na agência Brás, eram duas travessas de casa, eu ia tomar lanche em casa. Fiquei lá um tempo no Banco do Brasil. Fiz parte desse... porque antigamente era diferente, você ia no banco... entregava o papel para uma pessoa, entregava o cheque... aí ela te dava um número. Aquele cheque caminhava para verificar a assinatura, debitar na conta... depois é que ia pro caixa e o caixa chamava você pelo número. Hoje o próprio caixa faz todas essas operações, mas naquela época não era assim. Então até vim fazer um curso aqui. Fui muito bem nesse curso, e aí eles me resolveram (...) me passar caixa, fui caixa executivo... lá. De certa maneira isso causou um certo problema lá, porque os mais antigos começaram a reclamar, e eu era jovem não tava... e aí um gerente uma vez quando houve uma mudança de gerente, resolveu me tirar do caixa executivo. E a gente ganhava uma... porque você no banco, devido a função, você tem um plus, certo. Então era caixa lá. E aí me puseram num outro setor. Aí eu fui reclamar com o gerente. O gerente me colocou na área de cobrança. Na área de cobrança, a gente trabalhava por tarefa, então tinha eu e tinha mais um... eu nem lembro mais o nome dele, tinha um outro rapaz que também estava estudando economia. A gente era muito rápido. A gente entrava as sete, onze e meia estava indo embora... a gente geralmente era das sete a uma né, que era o... a gente começou a sair mais cedo e não sei que e tal... aí os camaradas começaram a ficar de olho na gente. ‘Pô, os caras estão saindo muito cedo e não sei o que...' Acabaram com a tarefa... acabaram com a tarefa. Aí o que a gente fazia, demorava... ia no banheiro dez vezes... não sei o que e tal... para demorar com o serviço. Não terminava, passava para o pessoal da tarde [risos]. Resolveram voltar pra tarefa [risos]. Mas aí, todas essas coisas foram me fazendo desgostar do banco. Até porque, o banco é muito limitado, carimbo... [entrevistado imitando um carimbo] não sei o que, é muito assim: ‘Ah! vê o manual de instrução, como é que faz isso...' E nessa época, eu tinha sido convidado para ser o assistente do professor _________________ de estatística. E eu estava corrigindo umas provas lá, quando o professor Orestes Gonçalves, que era uma pessoa muito conhecida, um professor muito conhecido, me convidou e falou assim: ‘Você não quer trabalhar comigo na secretária do trabalho? Eu falei: ‘Ah... mas quais são as condições e tal...' Ele falou: ‘Ó, as condições são essas...' Era um bom salário, só que eu ia ser credenciado, não tinha segurança nenhuma e tal. Eu fui falar com o meu pai, eu falei: ‘Pai, eu recebi uma proposta...' ‘Pelo amor de Deus, não vai sair do Banco do Brasil. Banco do Brasil é para toda vida! Se... lá você amarrou o burro na sombra, se... é uma loucura!' Eu falei: ‘Não pai... eu não estou satisfeito lá. Eu... eu vou...' Eu tinha muito respeito por esse professor, aliás a gente veio a ter uma amizade muito intensa, então eu fui lá como supervisor da equipe técnica do grupo de planejamento setorial, que ele implantou na Secretária de Trabalho e Administração. Eu pedi demissão do banco, já tinha quatro anos e pouco de banco, e fui [20']. Aí... comecei a trabalhar na secretária, fiquei um tempo lá... e nesse ínterim, teve um problema aqui. Eu tava já como professor assistente lá na fundação Santo André. Aí eu vim pra cá, o professor Orestes veio pra cá, logo em 60, aqui começou em março... [entrevistado se corrige] em agosto de 68... não, foi... em agosto de 68 começou a faculdade aqui, o professor Orestes que dava introdução na economia veio para cá. E aí começou a ter um problema aqui, e me convidaram para dar aula de análise micro econômica. Eu vim aqui inicialmente, como professor de análise micro econômico, que era uma disciplina do curso de economia que eu tinha me formado né. Aí eu vim pra cá, dei essa disciplina aqui, e aí teve um professor de estatística que começou a ter um problema aqui, o nome dele era Testa... professor Testa, não lembro o nome todo dele. E ele saiu e me colocaram para dar estatística que era o meu forte, era realmente essa disciplina. E aí fiquei todo esse tempo aqui, como professor de estatística, tudo. Mas eu não parei de estudar, eu fiz uma especialização na fundação Santo André e na área de análise de sistemas. E depois lá, um dos professores falou que estava sendo implantado na USP o curso de mestrado em administração. Eu sou da primeira turma lá. E eu acabei indo para lá. E eu acabei indo para USP, fazendo o mestrado lá. Aí comecei a dar aula lá também, fui convidado para dar aula lá, certo. Mas nunca deixei de dar aula aqui, continuava dando aula aqui, porque mesmo na USP, mesmo quando me efetivei lá, eu nunca fui dedicação exclusiva. Eu era inicialmente turno parcial, depois passei a turno completo, o que me propiciava poder dar aula em outros locais, certo. Então foi assim que eu me iniciei nessa vida de professor que eu adoro, adoro...

 

Pergunta:
Como é ____________________.

 

Resposta:
Então eu vim pra cá, e continuei. Lá na universidade eu segui a carreira. Fiz o mestrado. Fiz o doutorado. Fiz a livre docência. Hoje eu sou aposentado de lá, certo. Na minha última... (...) no meu último concurso que eu fiz lá de professor livre docente, eu fiz sobre a interabilidade... estava no começo. Eu fiz sobre a interiorização da variável ecológica nas organizações, era uma coisa nova. A partir daí eu escrevi o primeiro livro de gestão ambiental na empresa no Brasil. Eu sou o pioneiro de gestão ambiental na empresa. Ainda... atualmente meus livros tem uma boa saída, eu vendo mais de mil exemplares por ano, certo. É engraçado esse negócio, porque a Rio 92 né, que tratou do tema, eu queria fazer o livro na mesma época da Rio 92, mas não saiu. Saiu em 93, certo. Aí eu... depois que eu me aposentei lá na USP, aí eu andei... rodando por aí. Uma vez eu estava em Santos, logo que eu tinha me aposentado na USP, estava dando aula, mas tinha me aposentado lá. Aposentei lá jovem. Eu tinha uma casinha lá na praia de Boracéia, lá em São Sebastião. Eu estava passando as férias. Eu olho no Estadão: ‘Precisasse de um diretor de pesquisa e pós-graduação.' Falei até para minha mulher: ‘Acho que arrumei um emprego. Vou mandar minhas coisas para lá.' E aí me chamaram... eu acabei ficando lá quatro anos na Universidade de Mogi da Cruzes, mas nunca largando o IMES, certo. Naquela época IMES, [25'] não mais na USCS né. Atualmente é USCS, mas... aqui é... o IMES tem uma importância na minha vida que é uma coisa... é como eu falei, ela é uma extensão da minha família. A gente... éramos poucos aqui, então chegava às vezes na quinta feira, a gente era moço e tal. ‘Pô vamos fazer um churrasco aí no domingo, tinha aí do lado do ginásio, tinha uma quadra...' ‘Ah! Você traz a carne. Você pega as bebidas e tal...' Traz a família. A gente ficava jogando bola, as crianças ficavam brincando. Então a gente fazia festas assim. Depois... quando a gente criou a Aproximes, até por uma iniciativa minha e do professor Gianelo. Porque o professor Gianello eu fiquei sabendo que ele cozinhava bem. Então eu falei: ‘Pô Gianello, vamos fazer alguma coisa.' E eu gosto muito de frutos do mar, e ele é um especialista nisso. Eu falei: ‘Você toparia fazer um jantar aí de frutos do mar? Ele falou: ‘Pô, eu toparia...' Aí a gente convidou os professores tudo, e arrumamos nas Casas Bahia, que ela nos cedeu o salão. Eles tinham uma cozinha lá e tal. Então, todos os professores foram lá ajudar ele. Fomos comprar um camarão. Fomos no mercado de Santos buscar, tudo. Fizemos lá e tal. E depois as mulheres foram encontrar com a gente. Depois a gente saiu de lá, veio tomar banho em casa, não sei o que. Voltamos lá e foi um sucesso fantástico, naquela época o diretor era o professor Claudio Dall'Anese cujo filho hoje da aula aqui inclusive. E ele ficou tão contente com aquilo. Aquilo nos uniu bastante. É isso que eu falo, havia uma união. Aí nós resolvemos criar a Aproximes, certo. Porque a gente tentava criar um nome: ‘Associação dos Professores do IMES', aí eu resolvi fazer, vamos chamar de ‘Aproximes'. Porque é uma maneira de você trazer o pessoal para cá. E aí nós começávamos a fazer. Aí tinha... nós mesmos fazíamos a comida, então tinha noite espanhola, a noite portuguesa, a noite mineira. A mulher do professor Joaquim naquela época, mineira que era, fazia a comida. Então nós... então veja, naquela época, as coisas eram muito mais difíceis do que agora, então a gente não tinha tanto dinheiro. Então às festas da Aproximes eram realmente o ponto de encontro da gente. Então a gente vivenciava isso. Dava aula aqui, encontrava os amigos aqui, depois a gente saía. Era uma coisa importante. Sexta feira era muito comum à gente sair para comer pizza, certo. Então a gente saía, ia até a Pizzaria Brasil lá, no centro de São Caetano. Então era... sabe, era uma coisa muito legal, muito legal. Era... quem entrava no IMES naquela época, não queria sair mais, até porque também, o salário ombreava com os melhores salários que existiam na época. Então poxa, você está em um lugar, que você faz uma coisa que você gosta, que você é bem remunerado, que você tem um ambiente bom. Está no melhor dos mundos... no melhor dos mundos... certo. Então... é engraçado que o IMES na minha vida tem essa conotação, porque inclusive eu sou casado, fiz quarenta e dois anos de casado com a minha esposa. E é engraçado, que quando eu vim pro IMES eu conheci a minha esposa... [entrevistado se emociona e começa a chorar] [30'] E é uma identificação muito grande nessas coisas [entrevistado chora novamente]. Vocês estão mexendo numas coisas... tão... tão caras para mim... [entrevistado novamente se emociona] tão caras... ela é... uma coisa importante. Então às nossas famílias se conhecem, vivenciaram junto e tal. Depois e que com a expansão... com a criação do campus dois... com o aumento da escola... hoje nós temos mais de 300 professores... quer dizer, não podemos garantir... que... não podemos garantir... não, não precisa... [entrevistado recebe um lenço da entrevistadora] não precisa... porque eu não vou fazer isso que você está imaginando [risos].

 

Pergunta:
[Risos].

 

Resposta:
Não, não. Tudo bem, muito obrigado. É porque vocês tocam num valor intrínseco muito grande... [entrevistado se emociona e chora] (...) Muito bem, vamos continuar...

 

Pergunta:
Como você conheceu a esposa do senhor?

 

Resposta:
Vixe. Eu trabalhava no Banco do Brasil, lá na... ficava próximo do Lago da Concórdia, e minha esposa trabalhava... numa... na Fotótica. Tinha uma loja da Fotótica na avenida... ali é avenida, acho que ainda é avenida Rangel Pestana, que a Celso Garcia começa... é, ainda é Rangel Pestana. E tinha uma coisa, quando eu trabalhava no Banco do Brasil. Eu sempre ajudei em casa com o salário. Quando eu entrei no Banco do Brasil, eu falei para o meu pai: ‘Olha, as gratificações vai ficar para mim.' Porque a gente recebia naquela época no banco, dezesseis salários por ano, você tinha quatro gratificações. Então... ele concordou. E eu aproveitava, eu gosto muito de viajar. Eu aproveitava e viajava. E combinei com outro profe... [entrevistado erra e se corrige] outro aluno que estudava comigo, o Vitor Sausio, falava: ‘Vamos pegar umas férias aí, vamos...' E fomos uma vez para... naquela época de Fusca mil e duzentos, fomos até Recife um ano. E depois no outro ano, fomos até... ele até tinha parentes lá, na Argentina em Buenos Aires. E tiramos fotografia, e aí eu fui revelar a fotografia, e fui na Fotótica quando eu vi a minha esposa, eu fiquei encantado por ela. Ela é muito bonita, realmente. Aí vai que vai... convidei ela para sair, ela falou que não, que ela namorava... não sei o que e tal... tá bom. Depois ela saiu de lá da Fotótica foi trabalhar na Eletroradiobraz daquela época, também era lá na avenida Rangel Pestana, próximo do lugar que ela trabalhava. Ela morava na Vila Esperança. E eu pegava o ônibus e às vezes eu encontrava com ela e ficava olhando e tal, mas caramba... Aí, um dia eu estou no banco, e o rapaz falou assim: ‘Pô, fui lá no Gonçalo.' Gonçalo é uma outra Fotótica depois ela saiu da Eletrobrás, foi trabalhar no Gonçalo. Só que ficava na rua Maria Marcolina que era uma travessa da Rangel Pestana. Falou: ‘Tem uma menina que perguntou de você.' Aí eu já falei: ‘Pô, quem é?' ‘Ah, não sei.' ‘Vô lá' Arrumei uma coisa pra tirar fotocópia [risos]. [35'] Quero saber quem é! Aí eu vi ela lá, mas acontece que eu chegava lá, (...) e não sei por inibição dela ou qualquer coisa que eu valha, o negócio não rolava... não rolava... Falou: ‘Pô, mas ela falou. O cara falou. Pô a menina... acho que falou bem de você.' Chegava lá, aquela normalidade... eu falei, putz... caramba essa menina aí não dá não, não dá, não dá. Bom, aí... eu fui num baile de carnaval (...) no Corinthians, certo. E eu estava lá, com uma outra menina, tá lá né... aí eu vi ela passando e tal, não sei o que, ela olhou pra mim e tal. Eu falei: ‘Pô, todo hora eu vou atrás dela.' [Risos]. Eu falei: ‘Bom, tudo bem.' Aí eu fiquei lá, dancei com a outra menina e tal, no dia seguinte, eu recebo um telefonema, certo. Ela falou: ‘Ah, eu te vi lá no baile, não sei o que...' Aí nós combinamos um encontro. Ela não foi no primeiro encontro, não sei porque cargas d'água ela não foi. Eu fiquei derrubado né, derrubado... derrubado. Aí depois ela me telefonou: ‘Não!' Até hoje eu não sei se ela foi ou se ela não foi. Ela fala que foi, eu não acredito. Ela falou que se equivocou no local de encontro e tal. Aí ela me telefonou uma segunda vez, aí realmente eu era apaixonado e ainda sou. [Entrevistado se emociona] Eu não sabia que era para falar sobre minha vida, pensei que era para falar sobre a escola. É... a minha... eu adoro a minha esposa. Deixa eu ver se tenho, acho que está lá em cima. Depois vou mostrar a fotografia dela. E ela foi realmente... talvez a grande responsável por eu ter conseguido tudo que eu consegui na vida. [Entrevistado chora] Grande companheira, mãe maravilhosa, esposa... nossa... Paula teu nome? É o maior tesouro que eu tenho na minha vida [entrevistado se emociona e chora]. É a coisa mais importante que Deus me deu nessa vida, porque ela me deu tranquilidade para me poder estudar. Me apoiou... quando eu falei para ela: ‘Pô, vou fazer o mestrado.' Ela falou: ‘Não, faz sim!' Fiz o mestrado. Fiz o doutorado. Só lembro que quando eu falei que ia fazer livre docência ela falou: ‘Pera lá! Você já fez tudo, já perdemos férias. Nas minhas teses, na minha dissertação tem muito ponta pé dos meus filhos querendo que eu levasse eles para passear, e a gente tendo que se dedicar' Ela falou: ‘Ó, você pode fazer, mas não conta comigo' E eu acho que ela teve razão porque, veja... é uma coisa engraçada né. Se você for, por exemplo, na Universidade de São Paulo, pelo menos onde eu frequentava a maioria... tem um monte de gente descasada, casada pela segunda vez... tudo... porque você acaba inebriado pela carreira acadêmica e de certa maneira, você acaba... por causa de pesquisar, de ter que fazer as coisas, você acaba relegando a família a um segundo plano, certo. [40'] A minha esposa fala que ela foi pai e mãe dos menino. Eles faziam aniversário, eu estava dando aula à noite aqui. Dava aula, tinha que dar bastante aula, certo. Então não tinha tempo de comparecer as coisas quando era dia de semana e tal. Então realmente. E eu também não gostava de faltar porque, veja. Eu digo que o professor, ama os seus alunos como se fosse seus filhos. É uma coisa muito legal. Você está lá, passando para eles aquela experiência... nossa, eu adoro meus alunos. Não é uma figura, uma pessoa... não é uma figura de uma pessoa. Aquela figura de que você está lá, para indicar o caminho para eles, de mostrar como é que é. O que eles vão encontrar no futuro sabe... então realmente, nossa... eu falo que a sala de aula é a ribalta do professor sabe, porque tem até um... aquela... aquele tablado [entrevistado imitando um tablado] que se fica acima. Então o professor eu falo que é um artista frustrado, ele gostaria de estar no palco, mas está lá representando um papel importantíssimo, certo. Então... foi assim que eu fiquei com a minha esposa, eu tenho três filhos, dois filhos e uma menina que é a casula. Nossa... eu realmente posso dizer que fui privilegiado... fui privilegiado. Porque, veja... você ter uma companheira junto de você. Você fazer aquilo que você gosta, certo. Caramba! isso é uma riqueza que não tem preço...

 

Pergunta:
A sua família, é... a sua esposa no início da Aproximes, ela também participava das atividades?

 

Resposta:
Participava, sim. Ela era festeira como eu tudo, porque precisa ser festeiro. E a gente... eu fui cinco vezes presidente da Aproximes, certo. Inclusive na última vez quando nós fizemos trinta anos de associação. E realmente... era muito gostoso, sempre foi muito bom... foi muito bom... muito bom... eu faria tudo de novo. Era... muito... muito gratificante isso daí sabe... então... É... um tempo que foi bem aproveitado né, então...

 

Pergunta:
Como era a organização da Aproximes. Como você... como sur... [entrevistadora se corrige] Você falou que surgiu a partir dessa tese, mas como ela se institucionalizou né, como se organizou dentro da...

 

Resposta:
Bom, na verdade, ela sempre foi... contrariamente o que ocorria em outras associações de professores, ela não era uma associação reivindicatória, ela não foi criada para reivindicar as coisas, embora pudesse exercer esse papel. Ela foi criada para nos aproximar... certo. E realmente isso foi... muito legal, foi muito legal. E aí, a gente começou depois a fazer, fizemos o estatuto, fomos devagar... fazendo coisas, entende. E também a própria instituição sempre apoiou. Inicialmente até a Aproximes era de funcionários e de professores, mas depois resolvemos separar a associação de professores da associação dos funcionários... enfim. Elas estão aí presentes e elas sempre... eu acho que representam um papel importante. Não sei agora, muito dos professores ainda não são associados e tal, mas eu acho fundamental, porque se você tem uma aproximação com as pessoas... porque a sala de aula é muito engraçado, o professor vem lá, cinco minutos antes de bater o sinal ou dez minutos, outros até chegam atrasado [risos]. [45'] Então, o contato é efêmero. O contato dos professores na sala de aula é muito efêmero, porque é só aquela entradinha ou no intervalo, e você não conhece as pessoas. Então, esses encontros que a gente fazia, nos dava condição de você conhecer as pessoas... certo. De conhecer os filhos... das mulheres se conhecerem. Isso é muito importante... isso é muito importante, porque da uma, uma, uma... amalgama muito importante para consolidação da amizade, certo. Então... eu acho que pelo menos no nascedouro. Eu diria... hoje a universidade tem quarenta e poucos anos, mas durante... a Aproximes fez trinta anos, a dois ou três anos atrás, não lembro. Eu acho que nos vinte anos iniciais ela foi fundamental, porque veja, eu fui professor também na Fundação Santo André, fui até diretor da faculdade lá. Fui eu que criei o curso de administração lá, certo. E lá eu não consegui fazer o que eu consegui fazer aqui. Juntar as pessoas em torno de um ideal, porque na verdade era um ideal, certo. A transformação da faculdade isolado, instituto isolado, em uma universidade, era realmente a nossa ambição, até chegar um momento em que isso se concretizou, certo. Não sei se do ponto de vista social, foi um ganho ou não, porque aí começou a ficar muito grande, ficou... mas era o que norteava todos os nossos passos em direção ao fato que de naquela época existia um corpo docente muito bom, tanto que ela conseguiu fazer fama na região, porque não é por acaso. Escola é uma coisa que você demora anos para formar uma... um respeito, uma credibilidade, e pode terminar em seis meses. É muito tênue a respeitabilidade de uma universidade, de uma faculdade, certo. Então a gente primava por isso, entende. Então, isso é significativo.

 

Pergunta:
E o senhor é... pegou todas essas transformações né, do instituto... [concomitância de falas].

 

Resposta:
Todas, todas... todas...

 

Pergunta:
Até chegar à universidade né...

 

Resposta:
Todas, todas, é... todas. Até quando virou centro universitário para universidade, eu temi um pouco, porque... eu acho que a transição do centro universitário para universidade foi prematura. (...) Quando você passa para uma universidade, eu tenho experiência que eu trabalhei em outras escolas, principalmente depois que eu saí da USP, eu estive na UNIP, na UNICID. Ela exige, por exemplo, um corpo docente gabaritado. Você tem que ter pessoas em turno completo, uma porcentagem razoável em turno completo. Você tem que trabalhar com pesquisa. Tudo isso exige um aporte de recursos que tem que sair da receita da instituição, e a receita da instituição sempre foi a mensalidade dos alunos, nós nunca recebemos por parte da prefeitura alguma subvenção, eventualmente poderia acontecer. Já aconteceu até de o IMES dar dinheiro naquela oportunidade para a prefeitura, deslocar recursos daqui, porque naquela época a gente abria o vestibular, isso daqui enchia. Nós não tínhamos a concorrência que temos hoje de todas as demais instituições, entende. Então eu acho que foi um pouco prematuro. Eu acho que ela deveria ter ficado um pouco mais como centro universitário, [50'] para ganhar musculatura, para depois fazer. E nós tivemos depois posteriormente, alguns problemas, principalmente é... (...) na minha avaliação, quando nós saímos... porque, nós éramos fortes na área de negócios, na área de computação. Então do ponto de vista estratégico, a gente deveria ter perseguido essa linha de coisa. E houve, agora... talvez até por influência da prefeitura e tal, de nós enveredarmos pela área de saúde. Uma área que a gente não tinha experiência nenhuma, nós apanhamos muito para aprender lá, certo. Porque, até a visão dos docentes é diferente, certo. As pessoas na área de negócios como nós, na área de sistemas, mesmo na área de comunicação, elas tem uma preocupação com o business, com os negócios, com os recursos, com o dinheiro. E o pessoal da área de saúde, não. O negócio deles é qualidade, e eles estão certos, porque eles lidam com as pessoas no dia a dia, certo. Mas na área de saúde, se ela não tiver um bom aporte, porque você tem clínicas, tem pessoas que tem que ficar lá em período integral, atendendo, não sei o quê. É um outro mundo. E eu acho que, nós apanhamos muito para compreender e ainda hoje eu diria que eu não sei se aprendemos tudo que deveríamos aprender, porque é um mundo diferente daquele que nós estávamos acostumados, pelo menos é a sensação que eu tenho certo, em relação a isso. Então do meu ponto de vista, do ponto de vista estratégico, talvez seria melhor a gente ter ido para a área de telecomunicações, para área de automação industrial, para as engenharias que tenha uma interface com a área de negócios, muito mais forte do que a área de saúde. Agora, do ponto de vista social, o trabalho que a área de saúde faz, é muito importante para o município, mas nesse caso, a prefeitura deveria dar um aporte para poder fazer isso, porque sair da receita total, isso tem complicado, vamos dizer, o orçamento da universidade, certo. Pelo menos é isso que eu percebo, embora não tenho os números, mas eu percebo no dia a dia, certo. Porque eu diria, estamos em 2013. Eu acho que em 2007, 2006 em diante, a escola começou a ter muita concorrência, muita competitividade... e concomitantemente a isso, aumentou suas despesas. Então isso realmente trouxe um abalo do ponto de vista de recursos, que não existia no passado. Não existia no passado. A gente enchia todas as salas, tinha gente saindo pelo ladrão aí... mas hoje já não. Se vê, construíram a UNIABC ali. A UNIABC nunca trouxe nenhum problema para universidade, porque ela trabalha com um outro nicho de mercado, certo. Então são essas coisas que a gente percebe, porque (...) a qualidade da decisão, ela sempre é em função dos resultados, se o resultado foi bom, é porque a decisão foi boa, certo. Infelizmente a gente só sabe o que vai dar depois de ter feito a decisão. Então na minha avaliação, a universidade foi um pouco prematura, ela precisava de ter um maior amadurecimento pra passar para universidade, mas já que passou, mesmo os bebês nascidos prematuros tem um desenvolvimento muito importante na vida, então eu acho que cabe a nós trabalharmos nesse sentido. [55'].

 

Pergunta:
E a questão da EAD. Como é que funciona?

 

Resposta:
Bom, a EAD. Na verdade... ela funciona da seguinte maneira. Quando nós... quando o professor Silvio assumiu a reitoria, ele me convidou para que a gente pudesse implantar o EAD. Já tinha havido uma tentativa de montar o EAD em 2005, que se criou uma área aí, mas como nós somos uma autarquia municipal, e nós somos baseados numa lei municipal. Naquela época não tinha a figura do tutor, não tinha a figura do professor conteudista, então havia muita dificuldade de contratar essas pessoas e fazer a educação a distância crescer. Quando o professor Silvio assumiu, houve uma mudança no estatuto e se criou a figura do tutor e do conteudista. Então isso realmente, trouxe um novo paradigma para escola, eu assumi lá, cheguei lá, não tinha nada, e aí nós começamos a trabalhar, no sentido de primeiramente, paulatinamente, ir introduzindo as disciplinas no presencial. Porque, eu não tenho dúvida Paula, que realmente é o futuro. É inexorável. Daqui dez anos você vai ter registrado isso o que eu estou falando aqui. O presencial é que vai ser a exceção. Por quê? Porque é mais caro, certo. Você consegue fazer as coisas com qualidade. Veja, você tem muito mais recursos na educação à distância do que se tem na sala de aula. Se tá dando um curso. Você pode ver um vídeo ali, vai ver o artigo e tal, entra direto na internet. Coisas que a limitação de tempo na sala de aula, não existe no ciberespaço, entende. Como eu estava falando inicialmente para você. Veja... hoje você vai fazer comunicação, demora quatro anos. Caramba... se o conhecimento está no ciberespaço e você tem mais tempo do que eu, você é mais inteligente do que eu, porque você precisa demorar quatro anos para aprender às coisas. Se vai lá, aprende, presta o exame para saber se você adquiriu o conhecimento e pronto, estará apta a desenvolver suas atividades. Isso o ensino presencial não tem condição de fazer, certo. Outra coisa, às vezes na aula presencial você está lá falando, aí o aluno está pensando na namorada, está pensando no jogo de futebol, não sei o quê. Na frente do aparelho lá... se ele não prestar atenção, ele não entende! Com uma vantagem, ele pode repetir aquilo quantas vezes for necessária, enquanto que na sala de aula, ele está consumindo na medida que eu estou falando. Se ele perdeu, só no ano que vem ou no semestre que vem... certo. Então eu acho que o principal problema que a gente encontra na educação a distância, é a aceitação por parte dos professores. Eu acho que existe uma dissonância entre o pessoal que está dando aula, que é analógico... e o pessoal que está vindo para a escola que é digital, certo. Então eles não conseguem compreender que essa geração, é uma geração completamente diferente da nossa. Quando a gente estudava, a gente tinha que prestar atenção, não podia escutar barulho, não podia escutar nada para você ter concentração. Essa geração de hoje, é uma geração que está estudando, está entrando nos SMS, está escutando música, não sei, eles tem uma capacidade de múltipla tarefa, que nós não tínhamos. Então, não adianta você querer [1:00'] dar um ensino e uma aprendizagem para esse pessoal, que difere deles, porque na minha época em que eu estudava, o único local que eu poderia aprender alguma coisa, ou era na rua, ou era na escola. Hoje não. Hoje, todos esses alunos de primário e tal, já entra no google, já sabe tudo. Entra em todos os sites, sabe sobre um monte de coisa, certo. Então hoje o conhecimento está disponível. Não aceitar isso... o professor, ele tem que ser um orientador. Não dá mais para um professor se manter atualizado sozinho. Ele tem que ser um socializador do conhecimento. Hoje algumas escolas, principalmente na área da coisa, tem o PBL, que é o Problem Based Learning, que aprende por problematização. Começou no Canadá, na escola de medicina. É o seguinte: Tem um problema assim. A pessoa está com determinada enfermidade. Você procura isso. Você vê sobre isso. Depois nós reunimos daqui uma semana para discutirmos isso. Socializamos o conhecimento. Porque é impossível hoje dado o avanço das coisas, você se manter atualizado em tudo, é impossível. Então nós temos que orientar: procura aqui, procura ali, traz aqui e vamos socializar isso. E todos nós vamos aprender. Eu aprendo sempre com os meus alunos, principalmente trabalhando no mestrado, no doutorado lá da universidade. Caramba, eu aprendo mais com eles do que eles comigo, porque eles têm dez lá fazendo, e eu estou aprendendo dez coisas enquanto eles estão aprendendo uma só comigo, certo. Então é... realmente... nossa. Então a educação à distância, ela é inexorável, porque hoje a interatividade que pode existir. Hoje nós temos condições, de ter aula em tempo real e as pessoas estarem aprendendo isso na casa deles, certo. E depois tirar dúvidas, não tem problema, certo. Então cada vez mais eu acho que nós vamos... e o avanço disso é impressionante... é impressionante. O ano passado teve um grupo de donos de escolas que visitaram a Europa. Holanda, Bélgica e tal. Apenas trinta por cento dos alunos vão no presencial. Assistem na casa deles, na televisão deles, certo. O importante não é onde você aprende, certo. O importante é, se você consegue ter... absorver o conhecimento, certo. Porque, por exemplo, a educação é: ensino aprendizagem. Na minha época, o professor ensinava, se você aprendeu ou não é problema seu. Hoje não, graças a Deus. Não importa se eu ensino, se ele não aprendeu, não tem valor nenhum... não tem valor nenhum, certo. Porque se não, você tem aquela piada que diz o seguinte: a menina chegou pro pai e falou assim: ‘Papai, ensinei o totó a falar. É!? Chama o totó aí, chama o totó. E aí totó, fala alguma coisa. Lógico, ele só latiu. Ela falou: ‘Eu ensinei, agora se ele aprendeu ou não é problema dele, certo.' Então na verdade hoje, há uma preocupação muito grande com a aprendizagem, de nada vale você ensinar, se ele não aprender. Então hoje existem muitas formas da pessoa aprender. E eu acho que a educação à distância, o repositório que fica lá disponível para o aluno consultar, verificar, tirar as dúvidas e tal, é importantíssimo. Porque o resto ficava tudo na cabeça do professor. Isso não é possível, certo. Nós temos que socializar esse conhecimento. E essa juventude que chega na universidade, é uma juventude que está acostumada com isso, tem uma habilidade... você já viu a habilidade que eles tem de mandar SMS. O camarada tem uma habilidade nos dedos lá que está falando aqui, está fazendo assim, já está mandando uma coisa, [1:05'] quer dizer, é um outro público. E é aquilo que eu falei para você, ainda as universidades, a escola de uma maneira geral, não está preparada para isso. Eu acho que a tendência... e aquilo que eu falei, as universidades vão ensinar e cada vez mais... semana passada, o pessoal das mantenedoras teve uma reunião em Brasília sobre o ensino superior, entregou para o Mercadante, uma proposta de que as escolas boas em educação a distância, vão poder dar de trinta a cinquenta por cento da carga das presenciais a distância. Então a uma tendência de quê cada vez mais o ensino a distância vai ser incorporado como uma forma de ensino mais atuante, e mais barata. Isso é importante para inclusão social num país como o nosso, de pessoal que tem pouco recurso, que precisa ter formação, precisa de uma inclusão social. Então... negar isso é fechar os olhos para o futuro, é fechar os olhos para o futuro. A educação à distância, ela veio para ficar realmente, certo. Então talvez, até pela função que eu exercia de pró-reitor de EAD, eu seja um apaixonado por isso, mas no começo eu tive um pouco de receio, porque eu também era um camarada analógico da geração passada, mas eu consegui compreender o progresso que houve na área de comunicação. Hoje nós vamos poder, talvez com o recurso no dia de amanhã, o cara está lá na casa dele, através da televisão ele já te faz uma pergunta aqui e você responde como na televisão. O cara está lá na China, na televisão. O cara está falando lá na China, tem um delay certo, entre o que fala um e o que fala outro, mas... tudo bem, por causa do problema do satélite artificial. Mas de resto eu acho que, a tendência é que aproveitando essa autorização do ministro para que agente dê aulas de educação a distância, que a gente possa no dia de amanhã ter polos avançados aqui na região onde a gente é conhecido, mas realmente entendo que é fundamental que a escola seja preparada para isso, certo. E esse tem que ser o valor da universidade. A universidade tem que serrar fileiras ao redor disso. Como eu falei, muitos professores ainda veem a educação a distância, principalmente os mais antigos com um certo receio. Mas é apenas uma questão de compreender, se atualizar com aquilo que está disponível, que cada vez está evoluindo mais, certo. E que permite que a gente possa estar fazendo uma inclusão muito grande de pessoas que não tinham acesso por problemas às vezes físicos, por problemas de estarem localizados em locais ermos, enfim. Eu acho que essas manifestações que tem ocorrido, tem mostrado que as redes sociais são importantíssimas na geração, porque não usar as redes sociais para ampliar conhecimento? Certo. Tem professores que já estão usando Facebook como uma forma de contato com os seus alunos, etc. Então realmente hoje, (...) é o futuro. Eu diria que não é o futuro, acho que eu estou errado. É o presente.

 

Pergunta:
Professor, para finalizar, a gente fez um percurso aí né...

 

Resposta:
Ah! Você mexeu com umas coisas incríveis, incríveis... eu estava aqui divando analista.

 

Pergunta:
Falamos né, do responsável dessas lembranças, da construção dessa história. Você tem alguma mensagem final. Alguma coisa que o senhor queira, para a gente finalizar essa entrevista neste dia. [1:10'].

 

Resposta:
Que mensagem... eu poderia dar... olha... acho que a maior mensagem que eu poderia dar é dizer o seguinte: ‘Se Deus chegasse para mim e me desse uma segunda oportunidade de voltar aqui, [entrevistado se emociona] (...) eu diria... eu quero ser professor.' Porque... é tão bom... o professor tem a sensação que não envelhece, por estar sempre àquela juventude passando na frente dele. E ele não percebe... que o tempo passa. Está sempre conversando com os jovens... ele não envelhece. Ele envelhece na aparência, não envelhece... na alma. Não envelhece, no seu íntimo de ser. Eu adoro ser professor. Até a próxima.

 


Lista de siglas presentes no depoimento:
EAD: Ensino a Distância.
IMES: Instituto Municipal de Ensino Superior.
PBL: Problem Based Learning.
PUC: Pontifícia Universidade Católica.
SMS: Short Message Service.
UNIABC: Universidade do Grande ABC.
UNICID: Universidade Cidade de São Paulo.
UNIP: Universidade Paulista.
USCS: Universidade Municipal de São Caetano do Sul.
USP: Universidade de São Paulo.


Acervo Hipermídia de Memórias do ABC - Universidade de São Caetano do Sul